quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

De branco, é claro!

Exceto a bagagem ideológica que acompanha a virada do ano, não vejo nada mais de especial nisso. Nem minha cadelinha, Remela, que sequer compreende as luzinhas de natal e os foguetes que colorem o céu da virada... que nunca pensou sobre Deus nem criou um punhado de expectativas sobre o novo ano que se inicia. Mas a gente precisa dessas coisas. Precisamos erguer ideais e manter e difundir nossas crendices. A sociedade funciona assim.

E hoje, é claro, vou passar a virada vestido de branco! E espero não reencontrar os problemas que me apareceram nesta simples mas intrigante volta que a Terra acaba de percorrer em torno do Sol — problemas que, aliás, foram-me importantes para reavaliar o sentido a que atribuo à minha existência e àqueles com quem partilho esta jornada. É por isso que desejo muita paz, amor e empatia a todos vocês, meus queridos, e aos cachorros e árvores e vaga-lumes que habitam uma das fontes cósmicas donde emana vida, sonhos e mistérios.

sábado, 27 de dezembro de 2008

Quando dois são muito mais

Que fazer dos lábios que não são só teus? Nem o cheiro que me abraça... nem os olhos que me vêem.
Que fazer dos beijos que não são só teus? nem a língua macia que me acaricia o céu... nem o sabor que te escorre do ventre.

Que fazer com a impureza? dado que não te mostras limpa nem despida dos outros.
Que fazer com as outras? que te sujam de emoções que ficaram em mim.

Porque o beijo não é só teu. Nem os abraços que brotam de ti. Nem os sonhos que me fazem assim.

Que fazer comigo, afinal? dos olhos que não estão limpos para te ter... que te vêem como quem vê estrelas que já se foram.
Que fazer com o meu jeito-de-ser? que nunca foi puro nem despido de enganos.

Você eu eu — seres que se confundem com o tempo: pais e mães e paixões que se camuflam na gente; seres que se fazem nos outros, dos outros e para os outros.
Você e eu — vários que se misturam, que se fazem no amor, do amor e para o amor; seres que vagueiam entre o fel e o mel.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Fácil para quem pensa com a minha cabeça — minhas leis

Todo sistema é regido por leis. Essas leis são dadas a partir de uma espécie de economia. Não sei se a economia é quem rege as leis, e isso me faz pensar que as leis da física podem não ser invariáveis. É como a consciência que se altera com o álcool, com o sexo, com a fome. É como um louco que se via igual ao demais.

Mas pode ser que haja legislação da legislação — o que não quer dizer que haja Deus.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Como se...

Como se o amanhã pudesse ser antevisto pelo cálculo do agora...
Como se eu pudesse saber...

e me enganar.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Cadê aquela sombra?

Se já sinto o peso dos versos de amor; se já não olho nos olhos como quem quer comê-los; e se já não sei de quem sou, nem o que sou...
Se a chuva castiga apenas os corações mais fracos — de fazê-los correr, cansar e dormir —; e se vem avisar que Apolo precisa esperar; e se já não diz quando é que vai cessar...

Me diz... me diz os versos de boa esperança! Me diz sobre o reinado do espírito... me diz sobre a ressurreição do amor!... que eu já estou molhado demais... Demais...

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Descanso e reflexão

Tô precisando de um tempo. Tô me cansando de subir e descer com a maré... de correr com a correnteza. Tô precisando de sombra, água fresca e um espelho.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

De volta... mais uma vez

O andar e o conversar das pessoas interioranas são menos apressados. O coração bate mais devagar... A vida é mais comprida e tranqüila. Quase todos se conhecem... Se não diretamente, conhecem-se por um terceiro — um parente, um amigo. E cumprimentos como "Bom dia", "Boa tarde" e afins são mais comuns por aqui, no interior... e o natal é um tanto mais sincero... mais religioso.

Posto que as pessoas interioranas se conhecem mais e melhor, fica mais fácil descolar um emprego, criar novas amizades e estabelecer vínculos afetivos. Mas não é menos verdade que a privacidade acerca da vida particular esteja consideravelmente encurtada. E isso pode ser um probleminha para aqueles que não gostam de popularidade!

Os jovens estudam um pouco menos do que aqueles que moram nas grandes cidades. Os que querem — e podem — se aventurar profissionalmente, tão cedo se põem a migrar. Mas grande parte, por preferência ou contentamento, acabam criando raízes por aqui mesmo, onde nasceram e se humanizaram. E para aqueles que não querem dar andamento aos empreendimentos da família, ou àqueles que querem mas que pensam em se especializar mais no negócio, há sempre uma faculdade por perto.

E lá no fundo, em vez de carros, gritos e ambulâncias, cantam pássaros e grilos e algumas gotinhas de chuva, vozes que embelezam o ambiente sonoro do interior. E há também o latido dos cães, nossos melhores amigos, e as gargalhadas da criançada que brinca livre, contente e seguramente pelas ruas.

Mais que um pouco de verdade nessas coisas, há também um pouco de saudade. E a saudade muito comumente corresponde à vontade de que o futuro se assemelhe ao passado — não exatamente pelos fatos que o "constituem", mas bem mais pelas emoções que acompanhavam esses fatos e situações. É por isso que tive vontade de voltar a viver aqui, no meu Bom Despacho, minha terrinha natal... lugar que tanto se assemelha com o meu primeiro lar — o útero materno.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Segredos

Fico doido para contar e viver alguns segredos. Mas é tudo muito secreto!... E o tempo apaga o que não é contado nem vivido — como se nada tivesse existido.

domingo, 7 de dezembro de 2008

Prepotência


Ah, se fosse fácil... ser como plantas, borboletas ou sapos... como coisas simples que já sabem para aonde ir... Como quem tem todas as respostas para perguntas que nunca precisaram existir.

Mas não sou. E não é por isso que vou me perder, ficar escondido... E nem vou continuar a rezar. Pelo contrário, tenho motivos a mais para pensar, sentir e me exibir. Mas esses motivos não me fazem melhor... Nem me dão o direito de rir daqueles que não se perguntam por quê.

me sentindo um animal. Um animal que se confunde com perguntas que querem acabar com o que há de animalesco em mim. — Quanta prepotência... Quanta prepotência!

domingo, 30 de novembro de 2008

Chegada

Me mostra o norte que te fez chegar até aqui. Me mostra o caminho que se cruza com o meu... que nada, nada é por acaso. Nem as palavras, nem o abraço, nem o adeus.

Mas ainda estamos chegando.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Mais um pouco de mim

De lá para cá, venho me tornando alguém que nunca imaginei que pudesse ser. Nunca estive completamente satisfeito comigo mesmo; sabia que alguns eixos me estavam desajustados... Mas não fazia nem idéia da proporção do problema.

E a intelectualidade era a minha defesa, o meu refúgio, a minha sublimação. Ela era quem se fazia de ponte para que eu me comunicasse com o mundo, com as pessoas. Minha dignidade era fundamentalmente edificada a partir do valor a que eu e os outros atribuíamos à minha inteligência, à minha sabedoria — que, convenhamos, não é nem anormal nem espetacular.

Mas nunca foi o bastante. Eu nunca estive satisfeito. Sempre havia mais e mais a ser aprendido, a ser descoberto e construído. Sentia que meus esforços poderiam mudar o mundo — um belo e utópico sonho cazuziano. Fiz da paixão a fraqueza do ser. Do amor, pedido de ajuda daqueles e àqueles que não se bastavam. Porque a razão, e só ela, poderia elevar a humanidade à divindade — que, aliás, era só um conceito chulo e utopicamente idealista!

O que me faltava, afinal? Primeira e fundamentalmente, faltava-me autoconhecimento! Faltava-me humildade, sem a qual meus defeitos e problemas mais íntimos continuariam a ser camuflados, escondidos, esquecidos. Faltava-me aceitação, sem a qual não poderia ter espaço para que minhas emoções recalcadas pudessem emergir e me libertar dos enganos e barreiras que me acometiam... da prisão e do refúgio administrados por minha razão.

E nada sabia do quanto as emoções dotam-nos de inteligência — sem as quais, por assim dizer, não se faria possível ser racional; sem as quais a vida não teria cor, desejo, satisfação... Sem as quais eu me poria longe de mim mesmo, como quem não se decide homem ou macaco, morto ou vivo. Porque é a partir delas que se presentificam o corpo e a mente; e toda a trama da vida não se daria sem o intermédio vivificador chamado emoção! E nem o ser seria; e nem a morte viria... porque não haveria vida!

É por isso que me ponho a sentir o que me grita das profundezas! É por isso que sei o que sei, e é por isso que sei do desgaste que me foi construído... Mas é dele que me assumo humano e reconstrutor de mim mesmo. Porque é de mim que devo primeiramente saber; e é do autoconhecimento que brota o embrião que dá curso à humanização do mundo.

sábado, 22 de novembro de 2008

Bem-vindo ao clube

Eis que me vejo a formar, mesmo que me faltem alguns meses, e a encarar esse mundo que me vive a cobrar esforços — um mundo que não se sabe por quê; um mundo que faz da produtividade o seu para quê. Mas já me disseram que o trabalho dignifica o homem — um esforço comumente desgostoso e doloroso, ainda que uns poucos se dão com a sorte de se realizarem pessoal e profissionalmente.

Jovens e jovens que se vêem forçados a crescer, a tomar decisões que lhe escapam a certeza, a segurança — jovens que dão linha a um movimento que desconhece a si mesmo; que desumaniza os seres que se dizem humanos; que estabelece quais são aqueles que merecem ter luz, comida e roupa lavada; que determina os valores que se fazem oportunos, convenientes.

Mas nós queremos ordem e progresso! — queremos organizar, ordenar o modo-de-ser das pessoas a partir de regras de conduta que se fazem incapazes de ruir o escudo que protege o poder. E queremos progredir, digo, produzir desenfreadamente, posto que o ter se mostrou muito mais eficaz que o ser — embora os índios amazônicos façam florir mais paz, amor e graciosidade que qualquer um de nós. Mas quem é que ainda sonha com isso?

Continuemos, assim, a produzir nossos carros luxuosos, nossos apartamentos, nossos filhos domesticados e gananciosos; continuemos a produzir mais preocupações, mais dívidas, mais poluição e mais ilusões acerca do que vem a ser "felicidade". E não nos esqueçamos de tomar o que restou do território daqueles que ainda resistem à nossa ignorância.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Doce

Eu quero a sorte de um abraço comprido; de um beijo que não se acaba com um adeus... que não salta de boca em boca, como que sem saber o que quer. Porque eu me cansei de fumar minhas preocupações... meu não-saber... minha fuga. Que eu não quero voltar a dormir.

Por que eu sou assim? Acho que já não importa mais. Só por agora — não importa! Queria ter bebido um pouco mais... mas queria ter fumado menos. Do que adianta as maçãs? Do que adianta as masturbações? Do que adianta duvidar da vida, da morte, de Deus?

"Por que cê tá carregando esse tijolo, ?", como quem achava graça na estupidez. Como se precisássemos de bons motivos para deixar que a correnteza levasse. Mesmo que nem sempre seja o melhor a fazer. Porque a correnteza também é dúbia... e nem sempre caminha de encontro ao mar.

Sabe? — deixa pra lá! É só a boca que tá um pouco suja. Mas logo passa. Logo que eu matar essa coisa de dar ouvidos à Psicanálise. (Ou seria de dar ouvidos aos meus desejos?) Porque a verdade é aquilo que quero. E eu quero aquilo que já me esqueci. Mas logo terei que colher as roupas do varal (eles não me deixam esquecer).

Acho que um pouco cansado. Essa coisa de me tornar adulto não tem sido mole. Mas eu não me deixo enganar! — guardo uma rapa-dura-mole na geladeira.

domingo, 16 de novembro de 2008

Quando queremos o aqui-e-agora

A arte de amar não se aprende em manuais. Cabe aqui o que Aristóteles dizia sobre as virtudes: aprendamos com a prática! Porque as revistas e os programas televisivos não vendem a receita do amor, mas aquilo o que queremos ouvir. A mídia lucra com a insegurança que assombra o indivíduo moderno — insegurança sobre os futuros econômico e afetivo. E a gente quer o que é fácil e imediato, dado que o desejo-moderno não suporta a incerteza de sua satisfação. É por isso que corremos do amor.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Da política da afetividade


O amor não acontece só. Não se ama aquilo que não se tem. Não se ama aquilo que não se conhece. O amado precisa estar representado, vivificado na consciência do amante. Amado e amante são, por isso mesmo, seres que compartilham um jeito-de-ser-no-mundo; seres que se encontram em desejo e em satisfação.

E quando não há respeito, transparência e empatia, dá-se comumente o problema da incompatibilidade afetiva. Mesmo a paixão, tão prazerosa em um primeiro momento, e tão comum e efêmera nos dias de hoje, mesmo a paixão não resiste caso o casamento ético-afetivo entre os sujeitos não se faça presente. É que a paixão é constituída de desejos e fantasias egocêntricos — o sujeito apaixonado vive essencialmente à parte do universo do outro.

Mas o amor pode nascer da paixão. E ele o faz na medida em que a amizade encontra espaço para florir. Ele o faz na medida em que amado e amante, sob a nítida sintonia em que se comunicam seus mundos, planejam juntos a arte de viver. O amor é, nesse sentido, independente da paixão... Mas não há ser que esteja totalmente imune à tendência inteiramente humana de se enganar, de se deixar dominar pelas pulsões. É por isso que o amor, a fim de não deixar que o intercâmbio afetivo pereça devido à paixão, recorre ao não menos importante recurso chamado razão.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

— O gato comeu?

Cê sabe... Todo esse drama, essa dor... Cê sabe que eu preciso dormir.
Sabendo que alguns dias exigem mais disposição, não sei se vou agüentar.
Só não sei se vou...

Queria te fazer de cama. A minha parece um pouco cansada de mim.
Pode ser o meu peso. Pode ser o meu cheiro.

Mas me fala de você, fala...
Cadê aquele sorriso que me olhava nos olhos?

domingo, 2 de novembro de 2008

Posso estar só...

Não sei se é saudade ou se é solidão. Sei que não posso ficar sem ter o que fazer. Mas sou feliz quando canto sozinho. Estou satisfeito quando cheiro a flatulência que me sai pelo rabo. Gosto de beber meu café e dançar coisas que nem sei. Meu quarto é o meu abrigo.

E sinto saudade da minha mãe. Saudade de quando eu morava no útero dela. Mas tenho que parar com essa vontade de completude. Tenho que parar com esses ideais de um mundo que ainda está por vir.

Ou o tempo é quem está brincando comigo? Estar gay por alguns momentos... fumar e me permitir idiota quando convir. Porque a crueza da realidade corrói o pâncreas. E logo toda a energia fica minada, esquecida, calada. É por isso que recorremos às ilusões.

Mas pensei que fosse melhor que eu não fumasse nem bebesse. E deixo essa saudade tomar conta de mim... sem contudo me tornar triste ou sozinho de tudo — porque estar só não me impede de ser de todo mundo.

sábado, 1 de novembro de 2008

Placebo

Jogue-os naquela caixinha de origami. A diarista sabe do que se trata. Depois vai catar o que ficou no chão e na cama... e ficará com o tempo.

Sabe? — essa coisa de tempo é mesmo muito curiosa. E eu nem preciso de cânhame para pensar assim. Porque aquilo tudo foi a noite de ontem. Cheia de chuva e de desenho animado. E aquele hambúrguer foi comido em câmera lenta. Só porque a cabeça de quem comia e via estava noutra balada. E só.

Sabe? — às vezes a vida muda. Mas é difícil saber se foi o ovo ou a galinha. Quer dizer: se a gente é quem muda a vida ou se a vida é quem muda a gente. Talvez estejamos falando da mesma coisa.

Meu corpo está sujo e coçando... e eu não quero pensar em mais nada. Acho que é um bom momento para se ouvir Placebo. Como se a felicidade fosse oriunda de um buraco negro.

domingo, 26 de outubro de 2008

O som dos objetos

E o que dizer sobre as coisas simples da vida? Quem as significa assim? Se eu não estiver de todo correto, é bem de perto que elas são aquilo que somos. Como se não houvesse simplicidade em si mesmas; e, por isso mesmo, elas logo podem assumir tamanha complexidade. E que podem, e são, constantemente mutáveis... e alienadas a nós mesmos!

Porque somos aquilo que as coisas são. Porque elas são aquilo que somos.

Que quando estamos belos e alegres, assim se faz o mundo: bonito e sorridente! Que quando não nos sentimos amados ou amáveis, o mundo se torna um ambiente impecavelmente desagradável. E é daí que surgem as ilusões — alternativas que acalmam o ímpeto daqueles que não suportam a realidade.

Mas a própria ilusão é uma realidade. É uma alternativa que sobrevive per se; e é alimentada e alimenta a si mesma... Mas é normalmente dissonante da dança que embala todo o resto do mundo. É por isso que elas perecem.

Mas "vamos morrer sem saber, amor".

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Acordar

Quando eu não durmo bem, meus dentes e corpo ficam sujos que só eles. Como se os sonhos fizessem com que a vida fosse outra. Daí que eu me nasço outro... e logo se vai aquele que se fez anteontem.

Mas quando a noite me é agradável, até o cabelo me faz elogios. Como se os sonhos me dessem aquilo que quero da vida. Daí eu me nasço outro... e eis que me torno aquele por quem me apaixono diariamente.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Do dia 18


Os vaga-lumes anunciavam o desejo de que chovesse algumas estrelas. Mas aquela noite, derradeira dos dias em que estive por perto, só testemunhou a chuva que me emergiu das costas e da esquina dos olhos. E os dela, tanto indecisos quanto encharcados, fizeram com que a noite chorasse por aquele momento maravilhosamente significante. Foi quando choveu.

E eu, que há muito não me sentia tão libriano, agradeci a um deus que acabara de me apresentar ao amor — amor à vida e àqueles a quem posso confiar minhas idéias e meus sentimentos; amor a mim mesmo e àquilo que me faz tão digno de levar a vida que tenho: minha humanidade!

Porque aquela noite selou outra etapa do meu renascimento. E agora, mais do que nunca, sinto-me livre e à vontade para amar e ser amado... e deixo-me despir e dispo o véu de quem me confia a sorte das estrelas que continuarão a cair — mesmo que o céu permaneça nublado.

sábado, 18 de outubro de 2008

Chove

Não sei quais palavras usar para dizer aquilo que nem sei. Minha cadelinha me olha como quem diz que me entende. Mas nem eu sei.

O futuro nunca esteve tão distante de mim. Isso me faz sentir que a vida está se tornando um pouco mais longa. Porque é assim que a vejo: longa e misteriosa.

No mais, um pouco cansado e razoavelmente perdido.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Run, Forrest!


Como, Forrest, não ser inteligente mas entender o amor? Queria a coragem e a vontade que a vida te deu. Coragem para se aventurar, ser livre e correr! Coragem para ser aquilo que quer ser, tanto mais livre das correntes mundanas que aprisionam o nosso umbigo. E não ter pressa nem vergonha; e nem deixar de sonhar ou aparar a grama.

Mas eu fui Forrest por alguns instantes. Decerto durante todo o tempo em que o assistia, e provavelmente ainda o farei enquanto aquela história me estiver fresca e dançante. E talvez, se minha sorte quiser, parte daquele Forrest ainda consiga sobreviver à disputa dos traços de caráter que tentam definir o meu jeito-de-ser-no-mundo. Assim espero.

Porque quero dias mais simples e amáveis. Quero outro pôr-do-sol com quem eu possa rir e fazer rir. E quero a perenidade de um romantismo que não me acompanhava há muito tempo.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

"Só o amor é luz"

Queria os dias em que o pôr-do-sol me fazia enxergar uma vida romântica e viçosa. Queria os dias em que eu não me lembrava da incerteza do amanhã. Queria os dias em que eu só chorava de felicidade.

Mas agora, perdido que estou, não sei por que chove ou brilha a estrela; não sei por que me deito ou me pego de pé; nem sei se devo arrumar a cama que vai estar bagunçada pela manhã. É como se Deus, bem devagarzinho, estivesse brincando de me enlouquecer.

Mas eu não acredito em Deus... E às vezes nem acredito que hoje é o meu aniversário — dia de abraços e declarações que me fazem sorrir e reanimar minha fé.

Mas só porque acredito no amor. Porque é dele que nasce e se põe o meu sol. É dele que o dia se faz... e é dele que o dia se vai.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

[...]

Só a própria pessoa para saber o fel e o mel que é sê-la. E só a empatia consegue aproximar o Outro daquele que se expressa sobre o que lhe é sentido. Fora isso, o que resta são julgamentos, preconceitos e críticas infundadas e totalmente revestidas pela ignorância — coisas que segregam, que distanciam os seres uns dos outros.

Mas eis que surge um outro problema: a ignorância de si mesmo! Porque não há autenticidade nem plena intersubjetividade se não há autognose! E não há autognose senão pelo reconhecimento e respeito acerca do que é sentido e pensado; e é do reconhecimento e do respeito próprios que se brotam mudança e encontro — consigo mesmo e com o outro.

E não há amor nem amizade sem essas coisas.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Por esse caminho

Já que a ciclotimia se faz necessária e inevitável, visto o amor não ser coisa dada nem caída do céu, hei de desenvolver aquilo que tanto aprendi enquanto estive latente: expressar-me e fundir-me às coisas e momentos simples que encerram meus dias. Com o café; com a música que me entra e me sai; com os versos que escrevo e recito a mim e aos outros; com os passos e saltos que me trazem e me levam de casa; com os sorrisos e gestos e palavras que silenciam minha solidão; com as mulheres nuas que me encaminham à amada; com o ímpeto dançante que me devolve à loucura e à tentativa de saná-la — enfim, fundir-me-ei a coisas que possam domar o meu humor.

Porque eu sou medo e coragem; dor e prazer; riso e lágrima; passado e futuro; amante e amado; e toda e qualquer contradição que acomete a alma daqueles que se dizem humanos!

Mas o propósito primeiro é que a ambivalência seja encurtada. Que todo o vigor e os potenciais sejam efetivados, atualizados! Que toda a grandeza do ser, embora imperfeita e inacabada, aproxime-se daquilo a que chamamos cristandade — mesmo que a modernidade tardia insista em corrompê-la e distanciá-la de nós.

Pergunto-me, pois, e como sugeriu o poeta, se só o amor é luz! Pergunto-me, enfim, se estamos realmente dispostos a construir a escadaria que conduz ao nirvana, à plenitude, à excelência do ser-no-mundo! — e se o amor é definitivamente a ascendência a que me refiro e anseio.

No mais, resta-me tentar e tentar... com toda a coragem e humildade que me crescem a cada dia.

domingo, 5 de outubro de 2008

Medo e coragem

Queria que fosse de uma vez por todas — minhas descobertas, meu café, minhas canções e o amor que cultiva o meu humor! Mas queria não saber do amanhã. E nem sei.

Somos seres contraditórios, dizem... e o ego é a instância que sintetiza a guerra que acomete o corpo e a alma! Mas a psicanálise fede — como toda e qualquer coisa que se julga perfeita e acabada. É por isso que me julgo imperfeito, inacabado e relativamente livre — embora um pouco fedido.

Ah! Eu nunca tive tanta certeza a respeito do amor! E como só os idiotas e ignorantes podem deter e produzir certezas, eis que me faço idiota, ignorante e completamente apaixonado!

— mas tenho medo e coragem.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Tornando-me humano


Não conseguiria dizer. Nem sentir. E os sonhos estão longe de ser realizações alucinadas de desejos reprimidos. Mas não vou esconder que minha libido esteve injustamente latente, reprimida. E fui eu que a fiz assim. E assim aceitei.

Vestiram-me como um deus. Deram-me beijos e levaram-me oferendas. Mas a incongruência um dia apodrece, e é da podridão que o demônio renasce. E assim me fiz: demônio de mim mesmo!

Mas chorei. Chorei por não me aceitar. E antes Deus do que o demônio, mas antes humano do que ilusão!

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Lanço-me à primavera, enfim!


Depois de tantos confrontos e peripécias, e depois da podridão que arraigou as entranhas do governo racionalista, eis que o romantismo assume o reinado de mim!

Mas foi preciso demolir o muro que me afastava das flores mais apaixonadas. Muro que eu mesmo erigi. E logo me pus a depenar o pássaro que me servia de oráculo — oráculo que me dirigia à fuga!

De sorte que as chuvas cessaram... e toda a profecia apresentou-se ridícula! Profecia que correspondia aos caminhos e descaminhos do medo, do trágico. Profecia que quase me adiou a chegada de uma segunda primavera!

Mas eis que me abraçam e me enchem os olhos — as flores, as cores... o amor!

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Diário da noite

Não puderam me explicar. Nem as nuvens. Nem o frio. Nem a solidão. E eu nem queria saber.

Fui engolido por um buraco. Fui tragado, diluído, queimado. A mãe não pôde me ajudar. Nem a esposa. Nem a amiga. Nem a razão.

Me pus a falar com as paredes. Ria de mim mesmo. Ria do frio e da derrota.

E me pus a calar, encolhido, ouvindo o que a bossa queria falar.

Mas acordei... só porque a calma chegou.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Parte de mim


[...] dessa voz que me acalenta os ouvidos... que me empurra um rastro de lágrimas turvas; [...] dessa voz que me canta a sabedoria poética... que reanima os impulsos do meu imaginário — a nudez, o café e os abraços.

A música, extensão lírica dos sentidos, tocada e cantada de acordo com a respiração: eis o que me toca — transparência e gingado íntimos! —; eis o que desperta o meu tom reprimido!

É como escutar a si mesmo. Música que me há, que se abriga em mim. Notas que se casam com o que me ponho a ouvir.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Tardes

Clara e suave: assim se faz a tonalidade das nossas palavras vespertinas. Como um porto que abriga o sereno de uma noite tranquila; como o afrouxamento do aperto que injustiça os nossos corações. Assim é a nossa amizade, inundada pelo amor que se faz desperto e colorido: a casa nonde a paz encontra o seu clímax. — Aquela paz que a cerveja não traz.

Noutro chamado


Nonde a astenia me abraça... e o movimento precisa ser abortado! — mudo, fechado, vazio.

Mas queria falar. Queria tocar o que me é proibido. Queria ouvir a parte calada do discurso que me aperta os olhos.

Porque eu sou o enfermeiro da dúvida... e sou um enfermo que duvida demais! Sou pedaços de uma mesma coisa. Peças que estavam em guerra. Guerra que pediu um descanso.

Mas a astenia não é o descanso: é o desgaste, a fadiga. E a música é o remédio que me relaxa os músculos da face.

[...] que eu dramatizo o meu emaranhado afetivo, eu sei! — de sorte que o drama encena a comédia, o ridículo, a sutileza das formas. Formas do agir, do pensar, do sentir. Formas toscas que me dão o prazer de experimentar a derrota, a decepção, o medo de tentar! Formas que embelezam a imagem que o espelho me faz; que mascaram a alegria e a fome que eles dizem sentir — fome da vida, dos outros, de mim!

domingo, 7 de setembro de 2008

Reencontrando

[...] mas Remela não me compreende. Queria que ela tomasse um pouco de café comigo. Cachorros costumam ser bons amigos. Bons ouvintes, digo.

Foi um dos sonos mais inquietos deste ano. Meus pulmões estavam curtos e sujos. Minha mente ruminava incessantemente a insanidade que me acometera. "O ego é um pobre coitado."

Se o amor for a casa de Deus, o fel e o mel passam a ser as estações da paixão. Deus não é um homem. E para os que fruem tanto da ciência quanto da poesia, o amor não é uma coisa só.

Ah! Por que Mozart me faz mergulhar tão fundo? Como pude beirar a insanidade? Não consigo compreender o que me precipitou. Será que fui um cachorro? Onde está o café?

[...] que o violão me ajuda a desatar o caos que me deixa submerso à dor. A dor do desconhecido. A dor de um coração que insiste em bater... que teme a guerra que parecia calada: a paixão!

Mas o cigarro já não é o mesmo. Nem o medo. Nem a mãe. Nem o irmão. A dor é fascinante para os mais ousados e otimistas. A dor, ao falecer, alimenta a barriga daqueles que sobreviveram. E eles engrandecem o peito e o coração.

[...] que eu preciso reencontrá-la. Quero contá-la sobre o amor e a esperança. Quero que ela presencie o meu renascimento. O nosso renascimento. O nosso amor.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

A preguiça que compensa os pequenos

Quando olhamos para o céu, o que é que há? E como é que a gente enxerga aquilo que há? De onde vem aquilo que há? De onde vem a nossa crença de que aquilo que há é tudo o que há?

Tânia Nogueira e a "lei do menor esforço": não me esqueço daqueles dias... daquelas aulas sobre a preguiça, o comodismo, a rigidez do pensamento... daquelas palavras que conceituavam o preconceito — coisa que não é boa nem má. O problema, dizem, é a forma como lidamos com aquilo que o mundo é — ou melhor: que aparenta ser! O que fazer com aquilo que as pessoas fazem da gente? O que fazer com as estrelas que os vaga-lumes colocaram no céu?

Aprendemos que os mortos viram estrelas, e é tão mais fácil acreditar. Aprendemos que Deus é o juiz, e é tão mais fácil temer. É tão mais fácil ser aquilo que eles querem que sejamos... É tão mais fácil fechar os olhos para a dúvida, para a coragem... Difícil é sair dos trilhos sobre os quais caminhamos há tanto tempo. Difícil é desafiar aquilo que fizeram da gente: os valores, a política, a ciência e a religião — entre outras, coisas que empacam o desenvolvimento sumo dos nossos potenciais adormecidos.

O céu é um véu que se abre para aqueles que dão a cara a tapa. O céu é uma regalia para aqueles que reconhecem a gordura da própria ignorância. Antes de conhecer o que há do lado de lá, lancemo-nos à confrontação com o que há do lado de cá!

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Dê-me o controle do tempo



Queria que o ar e o sangue ficassem quietos, encolhidos, no sufoco de um interminável abraço. Queria sufocar a oscilação que me leva ao caos, à imprecisão, às entranhas do mistério que não cabe à minha razão. Donde vem a calma? Donde vem as cores? Donde vem a música?

Queria preservar os olhos que me trazem o aroma dos dias que só eu sei viver... e queria copiá-los e dá-los a quem merece conhecê-los.

Queria provar da fonte que me faz querer. Queria não me lembrar que meus quereres são caroneiros do vento... vento inconstante... vento que me faz gostar e desgostar daquilo que leva e traz o sufoco do abraço — o tempo.

domingo, 17 de agosto de 2008

Para um novo dia, uma nova canção

Uma xícara de café requentado, sem açúcar, acompanhado por fugazes alarmes que me avisam que já há o que defecar: foi assim que eu me pus aqui.

Confundo-me entre dois desejos polares: despir o meu espírito para que qualquer um possa vê-lo, tocá-lo ou julgá-lo; ou deixá-lo guardado no véu da censura que obstrui minha libido.

Ah! Minha libido está fadada a esperar pelo amor! Usaram-na como quem não podia; usaram-na como quem não sabia! Deixaram-na submersa na culpa do desconhecido.

Quem poderá salvá-la? "Não é coisa que se faça sozinho", diriam. Mas o amor não é flor que desabrocha em qualquer estação. O amor não é só forma e beleza; nem é só a casa da paz e do prazer. Ainda somos pequenos demais para o amor; somos pequenos demais para sermos um... e para darmos luz à contemplação ininterrupta da semente nirvânica.

Mas há brechas para o amor. Há espaço para que eu me redima. Há quem saiba colher as mais belas e viçosas flores que brotam da poesia diária ­— poesia dos beijos e sonhos e dores que forram os caminhos que a vida nos traz. E eu já estou aprendendo a colher... com todo o cuidado e carinho que quase sempre me faltaram.