segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Tornando-me humano


Não conseguiria dizer. Nem sentir. E os sonhos estão longe de ser realizações alucinadas de desejos reprimidos. Mas não vou esconder que minha libido esteve injustamente latente, reprimida. E fui eu que a fiz assim. E assim aceitei.

Vestiram-me como um deus. Deram-me beijos e levaram-me oferendas. Mas a incongruência um dia apodrece, e é da podridão que o demônio renasce. E assim me fiz: demônio de mim mesmo!

Mas chorei. Chorei por não me aceitar. E antes Deus do que o demônio, mas antes humano do que ilusão!

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Lanço-me à primavera, enfim!


Depois de tantos confrontos e peripécias, e depois da podridão que arraigou as entranhas do governo racionalista, eis que o romantismo assume o reinado de mim!

Mas foi preciso demolir o muro que me afastava das flores mais apaixonadas. Muro que eu mesmo erigi. E logo me pus a depenar o pássaro que me servia de oráculo — oráculo que me dirigia à fuga!

De sorte que as chuvas cessaram... e toda a profecia apresentou-se ridícula! Profecia que correspondia aos caminhos e descaminhos do medo, do trágico. Profecia que quase me adiou a chegada de uma segunda primavera!

Mas eis que me abraçam e me enchem os olhos — as flores, as cores... o amor!

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Diário da noite

Não puderam me explicar. Nem as nuvens. Nem o frio. Nem a solidão. E eu nem queria saber.

Fui engolido por um buraco. Fui tragado, diluído, queimado. A mãe não pôde me ajudar. Nem a esposa. Nem a amiga. Nem a razão.

Me pus a falar com as paredes. Ria de mim mesmo. Ria do frio e da derrota.

E me pus a calar, encolhido, ouvindo o que a bossa queria falar.

Mas acordei... só porque a calma chegou.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Parte de mim


[...] dessa voz que me acalenta os ouvidos... que me empurra um rastro de lágrimas turvas; [...] dessa voz que me canta a sabedoria poética... que reanima os impulsos do meu imaginário — a nudez, o café e os abraços.

A música, extensão lírica dos sentidos, tocada e cantada de acordo com a respiração: eis o que me toca — transparência e gingado íntimos! —; eis o que desperta o meu tom reprimido!

É como escutar a si mesmo. Música que me há, que se abriga em mim. Notas que se casam com o que me ponho a ouvir.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Tardes

Clara e suave: assim se faz a tonalidade das nossas palavras vespertinas. Como um porto que abriga o sereno de uma noite tranquila; como o afrouxamento do aperto que injustiça os nossos corações. Assim é a nossa amizade, inundada pelo amor que se faz desperto e colorido: a casa nonde a paz encontra o seu clímax. — Aquela paz que a cerveja não traz.

Noutro chamado


Nonde a astenia me abraça... e o movimento precisa ser abortado! — mudo, fechado, vazio.

Mas queria falar. Queria tocar o que me é proibido. Queria ouvir a parte calada do discurso que me aperta os olhos.

Porque eu sou o enfermeiro da dúvida... e sou um enfermo que duvida demais! Sou pedaços de uma mesma coisa. Peças que estavam em guerra. Guerra que pediu um descanso.

Mas a astenia não é o descanso: é o desgaste, a fadiga. E a música é o remédio que me relaxa os músculos da face.

[...] que eu dramatizo o meu emaranhado afetivo, eu sei! — de sorte que o drama encena a comédia, o ridículo, a sutileza das formas. Formas do agir, do pensar, do sentir. Formas toscas que me dão o prazer de experimentar a derrota, a decepção, o medo de tentar! Formas que embelezam a imagem que o espelho me faz; que mascaram a alegria e a fome que eles dizem sentir — fome da vida, dos outros, de mim!

domingo, 7 de setembro de 2008

Reencontrando

[...] mas Remela não me compreende. Queria que ela tomasse um pouco de café comigo. Cachorros costumam ser bons amigos. Bons ouvintes, digo.

Foi um dos sonos mais inquietos deste ano. Meus pulmões estavam curtos e sujos. Minha mente ruminava incessantemente a insanidade que me acometera. "O ego é um pobre coitado."

Se o amor for a casa de Deus, o fel e o mel passam a ser as estações da paixão. Deus não é um homem. E para os que fruem tanto da ciência quanto da poesia, o amor não é uma coisa só.

Ah! Por que Mozart me faz mergulhar tão fundo? Como pude beirar a insanidade? Não consigo compreender o que me precipitou. Será que fui um cachorro? Onde está o café?

[...] que o violão me ajuda a desatar o caos que me deixa submerso à dor. A dor do desconhecido. A dor de um coração que insiste em bater... que teme a guerra que parecia calada: a paixão!

Mas o cigarro já não é o mesmo. Nem o medo. Nem a mãe. Nem o irmão. A dor é fascinante para os mais ousados e otimistas. A dor, ao falecer, alimenta a barriga daqueles que sobreviveram. E eles engrandecem o peito e o coração.

[...] que eu preciso reencontrá-la. Quero contá-la sobre o amor e a esperança. Quero que ela presencie o meu renascimento. O nosso renascimento. O nosso amor.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

A preguiça que compensa os pequenos

Quando olhamos para o céu, o que é que há? E como é que a gente enxerga aquilo que há? De onde vem aquilo que há? De onde vem a nossa crença de que aquilo que há é tudo o que há?

Tânia Nogueira e a "lei do menor esforço": não me esqueço daqueles dias... daquelas aulas sobre a preguiça, o comodismo, a rigidez do pensamento... daquelas palavras que conceituavam o preconceito — coisa que não é boa nem má. O problema, dizem, é a forma como lidamos com aquilo que o mundo é — ou melhor: que aparenta ser! O que fazer com aquilo que as pessoas fazem da gente? O que fazer com as estrelas que os vaga-lumes colocaram no céu?

Aprendemos que os mortos viram estrelas, e é tão mais fácil acreditar. Aprendemos que Deus é o juiz, e é tão mais fácil temer. É tão mais fácil ser aquilo que eles querem que sejamos... É tão mais fácil fechar os olhos para a dúvida, para a coragem... Difícil é sair dos trilhos sobre os quais caminhamos há tanto tempo. Difícil é desafiar aquilo que fizeram da gente: os valores, a política, a ciência e a religião — entre outras, coisas que empacam o desenvolvimento sumo dos nossos potenciais adormecidos.

O céu é um véu que se abre para aqueles que dão a cara a tapa. O céu é uma regalia para aqueles que reconhecem a gordura da própria ignorância. Antes de conhecer o que há do lado de lá, lancemo-nos à confrontação com o que há do lado de cá!